Mandala – Um encontro contigo, uma janela aberta para o mundo.

É dos encontros sem pressa, aqueles que fazem parar o tempo, que nascem as melhores sinergias. Sentei-me com a Maria em frente ao mar, e o céu, também ele Azul Cardume fazia adivinhar bons ventos. Bebemos um café e, golinho a golinho, partilhamos as experiências, sensações e peripécias destes últimos tempos que ousaram afastar-nos. Distâncias à parte, descobrimo-nos muito próximas na vontade que ambas temos em fazer das nossas sessões terapêuticas um espaço onde se abraça a pessoa e todos os pequenos lugares que a sua imensidão contém. Viajamos no tempo e trocamos aprendizagens. Contei-lhe o momento mais marcante do meu percurso:

B. tinha 12 anos e chegou à minha sala por apresentar alterações de leitura e escrita. As suas dificuldades na produção escrita eram pequenas gotinhas de água no oceano imenso que era o seu silêncio. Esta menina vinha sempre acompanhada pela avó que a tratava com imenso carinho. B. chegava sempre à escola visivelmente incomodada. Não falava, entrava na sessão com os olhos a rebentar dessa tensão que recusava partilhar, acabando por desabar num mar de lágrimas. A avó não percebia, eu não percebia, a menina não dizia. A sua disponibilidade para as sessões era nula, tentei encontrar temas que a motivassem, mas em todas as sessões encontrava a mesma menina triste, vestida de preto, que não reconhecia em si vontades ou qualidades.

Certo dia, e recorrendo à sabedoria que a nossa intuição por vezes nos faz procurar, levei para a sessão lãs de várias densidades, fios de vários tamanhos e cores, e fiz um novelo confuso e desorganizado. Mostrei o novelo à B. e pedi-lhe para dar a cada cor uma emoção que tivesse dentro de si. Depois, num gesto simbólico, desenleamos o novelo e arrumamos as lãs, dando espaço e importância a cada uma das emoções que trazia dentro. Praticamente não falamos, apenas comunicamos no entrelaçar das linhas. Depois, pedi-lhe que escolhesse as cores que  gostaria de usar na construção de uma mandala. Sem se aperceber, ela escolheu as cores associadas às emoções menos boas que trazia dentro e sobre as quais não conseguia falar… ensinei-lhe a fazer os pontos da mandala e, mais uma vez, não falámos…cada uma dedicava energia à sua mandala e partilhávamos o silêncio…até que este é por fim quebrado:

B.: Sabes, eu às vezes sou má para a minha avó. Eu não quero, eu não faço por mal, mas às vezes grito e choro…

Meses de silêncio e desconforto desbloqueados! Deixei que continuasse a tecer a sua mandala e que fosse falando tudo o que lhe fizesse sentido. Percebi que a zanga que sentia pela avó vinha do facto de querer ser cuidada pela mãe, que de momento se encontrava ausente da sua vida. A ausência da mãe desencadeava não só a baixa-autoestima da menina como uma revolta face à avó que dava o seu melhor mas fazia um papel que não era o seu. Esta menina só queria a mãe mais perto. No final da sessão, B. despede-se da seguinte forma:

B.: Mariana, eu até fui boa a fazer isto, não fui?

O entusiasmo era visível e desde este dia as evoluções começaram a fazer-se sentir de forma galopante. Começou a investir em atividades em que sentia que era bem-sucedida, tornou-se mais comunicativa e integrada nos grupos sociais da escola, gradualmente começou a vestir roupas coloridas e a trazer temas do seu interesse para as sessões. Em casa, começou a aproximar-se da mãe, aceitando que esta nem sempre estaria presente, mas que nessas ocasiões a avó seria sempre o seu suporte. Passou a disfrutar da presença da mãe e a valorizar o papel da avó na sua educação. No final de dois anos de terapia juntas, disse-me que estava preparada para ter alta terapêutica. E estava. E como foi bom vê-la voar.

As mandalas são janelas para o mundo porque abrem o caminho para contactar com o que temos de mais profundo em nós, mesmo que por vezes não nos apercebamos. Existem mil teorias sobre arte-terapia e outras mil abordagens em relação às mandalas. Através da Azul Cardume, a Maria e eu convidamos-te a mergulhar neste entrelaçar de vínculos, que trará uma manifestação prática muito significativa na tua relação contigo, com os teus filhos e com as pessoas que te rodeiam.

Mariana Lança

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